O transtorno de linguagem pode ser confundido com outros distúrbios e a linguagem da criança pode ser tratada de forma incorreta. Confira como identificar.
Também conhecido como Distúrbio Específico de Linguagem (DEL), o transtorno de linguagem consiste em uma dificuldade para adquirir e desenvolver a fala. Segundo pesquisas, a cada 100 crianças com bons quadros de saúde, 7% delas apresentam algum grau de dificuldade persistente para se desenvolver nessa área.
Como funciona o desenvolvimento da linguagem?
Na grande maioria das vezes, por volta dos 2 anos de idade as crianças já têm um número de vocábulos que lhes permite expressar-se verbalmente com facilidade. Algumas nessa idade, e até um pouco antes, já utilizam frases simples, com verbos, adjetivos e preposições, relatam fatos e criam seus próprios vocábulos. Contudo, além das diferenças individuais, que devem ser respeitadas, precisamos estar atentos a fatores determinantes na aquisição da linguagem, e que quando alterados, podem interferir no desenvolvimento normal. Esses fatores podem ser subdivididos em biológicos, psicológicos e sociais.
Principais características do Desenvolvimento da Linguagem
0 a 3 meses
- Vocalizações não linguísticas. Essas produções tem pouca influência da língua – mãe;
- Sorriso reflexo;
- Apresenta movimentos corporais bruscos ou acorda ao ouvir estímulos sonoros;
- Aquieta-se com a voz da mãe;
- Procura fonte sonora com movimentos oculares.
3 a 6 meses
- As vocalizações começam a adquirir algumas características de linguagem, ou seja, entonação, ritmo e inicia-se a modulação de ressonância;
- A fase de lalação aparece por volta dos 3 a 4 meses e se distingue por sua fonação lúdica. A criança sente prazer em balbuciar (brincar com os órgãos fono – articulatórios);
- Para de chorar ao ouvir música;
- Começa a voltar a cabeça em direção a um som lateral e próximo.
6 a 9 meses
- Pré conversação - a criança vocaliza principalmente durante os intervalos em que é deixada livre pelo adulto, e também encurta suas vocalizações para dar lugar às respostas dos adultos;
- Localiza diretamente a fonte sonora, lateralmente e indiretamente para baixo;
- Responde quando chamada;
- Repete sons para escutá-los.
9 a 12 meses
- Localiza diretamente a fonte sonora para baixo;
- Reage paralisando a atividade quando a mãe fala “não”;
- Vocaliza na presença de música;
- Compreende algumas palavras familiares, por ex: “bate palmas” e “dar tchau”;
- Vocalização mais precisa e melhor controladas quanto a altura tonal e a intensidade. Agrupa sons e sílabas repetidas à vontade;
- Pede, recebe objetos e oferece-os de volta ;
- Usa gestos indicativos;
- Surge a primeira palavra muitas vezes não inteligível;
- Surgem as primeiras palavras funcionais que, em geral se dá um prolongamento semântico, por ex : chama “cachorro” a todos os outros animais;
- Crescimento quantitativo de compreensão e produção de palavras;
- Localiza fonte sonora indiretamente para cima;
- Gosta de músicas;
- Compreendem verbos que representam ações concretas (dá, acabou, quer);
- Identifica objetos familiares através de nomeação;
- Identifica partes do corpo em si mesma;
- Utiliza-se de palavra – frase (usa uma palavra que corresponde a um enunciado completo);
- Repete palavras familiares;
- Tenta contar;
- 18 a 24 meses;
- Surgimento de frases de dois elementos;
- Localiza fonte sonora em todas as direções;
- Presta atenção e compreende estórias;
- Identifica parte do corpo no outro;
- Inicia o uso de frases simples;
- Usa gestos representantes;
- Usa o próprio nome.
2 a 3 anos
- Inicia-se a sequência de três elementos, por ex: “nenê come pão”;
- Aponta gravura de objeto familiar para seu uso;
- Identifica objetos familiares pelo nome e uso;
- Aponta cores primárias quando nomeadas;
- Compreende o “Onde!” e “Como!”;
- Pergunta “o que”;
- Nomeia ações representadas por figuras;
- Refere-se a si mesmo na terceira pessoa;
- Combina objetos semelhantes;
- Constitui frase gramatical simples (com verbos, preposições, adjetivos e advérbio de lugar).
Como o transtorno de linguagem é adquirido?
Especialistas acreditam que o transtorno de linguagem apresentado por crianças está diretamente ligada à área de Broca do cérebro. Esta é uma área associativa ao córtex, denominada pré-frontal.
Responsável pela formação de palavras e pela expressão de palavras individuais, a área de Broca trabalha em conjunto com outras áreas cognitivas. Assim, crianças que apresentam afasias nestas áreas tendem a ter dificuldades no desenvolvimento da fala. As afasias, por si, são alterações adquiridas da linguagem causadas por lesões corticais e subcorticais, gerando dificuldades na fala mesmo que a pessoa entenda a linguagem falada ou lida.
Além do funcionamento anormal citado acima, médicos também acreditam que uma das principais causas de um transtorno de linguagem pode ser a grande influência de heranças genéticas.
Como identificar um transtorno de linguagem?
O diagnóstico do transtorno de linguagem pode ser feito a partir da observação da criança e de sua comunicação. Alguns sinais também podem se apresentar de forma involuntária por ela, tais como:
- Lentidão ou atraso no aparecimento da fala;
- Compreensão normal e dificuldade na fala ou compreensão alterada;
- Dificuldade na combinação de palavras para a criação de frases;
- Presença de alteração de sons durante a fala;
- Alterações morfossintáticas - a criança não consegue estruturar uma frase, tendo dificuldade com verbos e preposições principalmente;
- Falta ou erros no flexionamento verbal;
- Inversão na ordem das palavras nas frases;
- Os familiares não conseguem entender o que a criança quer dizer;
- A criança apresenta dificuldade para aprender novas palavras;
- Problemas semelhantes no ambiente familiar;
- Dificuldades ao aprender a ler e a escrever;
- A criança não consegue relatar fatos ou contar uma história;
- Pode haver a presença de gagueira, repetições de sílabas, palavras e hesitações ao falar.
Em alguns casos, como consequência dos sinais citados acima, alguns problemas sócio-emocionais podem ser desencadeados e algumas crianças podem sofrer no processo de socialização. É comum, por exemplo, que os pequenos se isolem dos amigos na escola ao perceberem que têm dificuldades de aprendizado. Se não tratado, o quadro pode evoluir para casos mais severos, como depressão e ansiedade.
Os tipos de transtorno de linguagem
O transtorno de linguagem não se caracteriza por um problema singular. Ele pode se apresentar de diversas maneiras e em diversas idades. Neste contexto, há quatro tipos principais que devem receber atenção:
Dislalia
Também conhecida como transtorno específico de articulação da fala, a dislalia é um transtorno de linguagem que ocorre quando a aquisição da fala da criança está atrasada. Assim, outras pessoas também têm dificuldade em entendê-la.
Disfemia
O transtorno de linguagem disfêmico é quando a criança tem dificuldade em manter a fluência em expressões verbais. A palavra, quando há a presença da disfemia, é interrompida em seu ritmo de forma brusca. O caso mais comum é a gagueira.
Afasia
São transtornos de linguagem causados por lesões cerebrais. Há diversos tipos de afasias e cada uma depende do local cerebral que foi lesionado. Elas podem ocorrer antes, durante ou após o processo de aquisição da fala.
Disfonia
Este se trata de alterações na emissão ou qualidade da voz da criança ao se comunicar. Ela pode se apresentar na rouquidão, soprosidade e aspereza da voz e pode ser causada por alterações nos músculos, na respiração, problemas orgânicos e ou funcionais das cordas vocais. Os transtornos de linguagem têm tratamento para os casos e estes podem ser feitos de diversas formas.
Como tratar este problema?
Ao se deparar com a possibilidade de um transtorno de linguagem, o primeiro passo que os pais ou responsáveis devem tomar é buscar um médico da área da fonoaudiologia.
Afinal, é fundamental que o diagnóstico seja feito de forma correta! Além disso, a agilidade na identificação do problema é fundamental a fim de que o problema não tome grandes proporções na vida da criança, podendo gerar problemas tanto de comunicação quanto psicológicos e de autoestima. Inicialmente, o diagnóstico pode ser feito por meio da exclusão de outras alternativas. Por exemplo, o primeiro passo é investigar se a criança não sofre de algum problema auditivo.
Excluída esta alternativa, verificar se a dificuldade é específica da área da linguagem ou se aspectos do desenvolvimento geral e motor da criança estão passando por alterações também é essencial. Além disso, aspectos como a falta de estímulos dos pais, responsáveis e familiares para que a criança desenvolva sua fala e linguagem ou a presença de algum problema emocional grave também são algumas das causas.
Após a exclusão de todas as causas acima e a realização de testes específicos com médicos especializados como fonoaudiólogos ou neurologistas, caso um transtorno de linguagem seja mesmo detectado, é necessário iniciar o tratamento.
Quanto antes iniciado o tratamento, maiores são as chances de eficácia. Este pode ser realizado por exercícios fonoarticulatórios. A criança deve ser auxiliada a entender suas dificuldades e desenvolver habilidades e estratégias para desenvolver sua linguagem, além de reconhecer seus pontos fortes e pontos fracos a trabalhar. O apoio à criança é um dos principais aspectos que vêm tanto dos profissionais os quais estão realizando o tratamento quanto dos pais e familiares, adaptando os métodos de ensino de acordo com suas dificuldades individuais.
Cuidados a se tomar
Quando se trata de uma criança que sofre de algum transtorno de linguagem, há alguns cuidados a se tomar para que ela cresça e se comunique de maneira clara e correta.
Diagnósticos incorretos
No Brasil, é muito comum que, ao diagnosticar crianças que apresentam algum dos sinais de transtorno de linguagem apresentados acima, um diagnóstico errado seja emitido para os pais. Por isso, é extremamente importante que o problema seja diagnosticado corretamente com uma equipe multidisciplinar que identificarão o melhor tratamento para cada caso.
Os professores podem auxiliar os pais na tarefa do diagnóstico ao observar o desempenho e desenvolvimento da criança na escola, além dos sinais apresentados pela criança e, assim, orientar ajuda profissional.
Problemas a longo prazo
A falta de tratamento ou sua aplicação inadequada deste, pode fazer com que crianças cresçam com falhas de comunicação, o que irá prejudicá-las no âmbito do desenvolvimento pessoal e emocional em sua vida adulta. A dificuldade na combinação, estruturação e execução de palavras e frases, problemas de entendimento na comunicação e outros problemas causados por algum tipo de transtorno de linguagem pode afetar a vida adulta em diversos aspectos.
Principalmente em aspectos profissionais e acadêmicos, a dificuldade na comunicação é um problema que afeta diretamente no psicológico das pessoas e em suas autoestimas, sobretudo para quem sofre destes transtornos. Por isso, é importante o diagnóstico precoce e o acompanhamento e tratamento médico para que a criança tenha seu desenvolvimento cognitivo e social de forma correta, permitindo que ela tenha uma vida adulta saudável e sem problemas relacionados à comunicação.